
Entre um livro e outro do Programa Lideranças Virtuosas, consegui ler esta obra-prima da Brené Brown, que há muito já estava na minha “wish list”, mas me faltava tempo ☹
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Já na introdução do livro, Brené declara que a maior certeza que ela trouxe da sua formação em serviço social foi a de que estamos aqui nessa vida para criar vínculos com as pessoas! “Fomos concebidos para nos conectar uns com os outros”. É esse contato que nos dá propósito e sentido de vida. Foi por essa razão que ela decidiu desenvolver uma pesquisa que explicasse a anatomia do vínculo humano, das relações e das conexões entre as pessoas.
Nas palavras da autora, uma verdade que todos temos em comum e que constitui a essência desse livro é: “o que nós sabemos tem importância, mas quem nós somos importa muito mais. Ser, em vez de saber, exige atitude e disposição para se deixar ser visto”. É aqui que entra em jogo a ousadia e a vulnerabilidade, temos centrais do livro.
Para começar, Brené defende que temos de afastar de nós a cultura da escassez, ou seja, a ideia de que não somos bons o bastante ou não temos o suficiente. Gastamos uma enormidade de tempo calculando quanto temos, não temos, queremos ou poderemos ter, e quanto todos os outros têm, precisam e querem ter.
Mas atenção, a autora ressalta que o oposto de viver em escassez não é cultivar o excesso. Na verdade, excesso e escassez são dois lados da mesma moeda. O oposto de escassez é o suficiente, o que Brené Brown chama de “plenitude”. Essa plenitude, “em sua essência, é a vulnerabilidade: enfrentar a incerteza, a exposição e os riscos emocionais, sabendo que eu sou o bastante”.
Ao falar de vulnerabilidade, Brené usa metáforas perfeitas como “máscaras” e “armaduras”, como sendo as principais ferramentas que usamos no intuito de nos protegermos do incômodo da vulnerabilidade. Com as máscaras nos sentimos mais seguros, mesmo quando elas nos sufocam. Com as armaduras nos sentimos mais fortes, mesmo quando ficamos cansados de carregar tanto peso nas costas. “A ironia é que, quando deparamos como alguém que está escondido ou protegido por máscaras e armaduras, nos sentimos frustrados e rejeitados. Eis o paradoxo: Vulnerabilidade é a última coisa que quero sentir em mim, mas a primeira que procuro no outro.”
Acreditar que somos bons o bastante é o caminho para fora da armadura. Isso nos autoriza a tirar a máscara! Brené, então, desmistifica os “mitos da vulnerabilidade”:
Mito 1: Vulnerabilidade é fraqueza
Nas palavras da autora “vulnerabilidade não é algo bom nem mau: não é o que chamamos de emoção negativa e nem sempre é uma luz, uma experiência positiva. Ela é o centro de todas as emoções e sensações. Sentir é estar vulnerável. Acreditar que vulnerabilidade é fraqueza é acreditar que qualquer sentimento seja fraqueza. (…)
Quando estamos vulneráveis é que nascem o amor, a aceitação, a alegria, a coragem, a empatia, a criatividade, a confiança e a autenticidade. Se desejamos uma clareza maior em nossos objetivos ou uma vida espiritual mais significativa, a vulnerabilidade com certeza é o caminho.”
O interessante da vulnerabilidade é que quando nós a testemunhamos em nós próprios, nós a consideramos como fraqueza, mas quando a testemunhamos nos outros, nós a enxergamos como coragem. Como diz Brené: “Eu sou atraída pela sua vulnerabilidade, mas sou repelida pela minha”.
Mito 2: Vulnerabilidade não é comigo
A autora explica que experimentar a vulnerabilidade não é uma escolha. Todos estamos sujeitos a ela. A única escolha que temos é como vamos reagir quando formos confrontados com a incerteza, o risco e a exposição emocional.
Mito 3: Vulnerabilidade é expor totalmente a minha vida
Nas palavras de Brené “vulnerabilidade tem a ver com compartilhar nossos sentimentos e nossas experiências com pessoas que conquistaram o direito de conhecê-los. Estar vulnerável e aberto passa pela reciprocidade e é uma parte integrante do processo de construção da confiança” e não sair por aí dividindo a minha vida e me expondo para qualquer pessoa.
Mito 4: Eu me garanto sozinho
Há estudos muito respeitados sobre liderança que sustentam a ideia de que pedir ajuda é essencial e que vulnerabilidade e coragem contagiam.
Brené explica que, durante a sua pesquisa e a sua experiência de vida aprendeu que “as pessoas que nos amam, aquelas com quem realmente podemos contar, nunca são os críticos que nos apontam o dedo quando fracassamos. Elas também não estão na arquibancada nos assistindo. Elas estão conosco na arena, lutando por nós e segurando a nossa mão!”
No capítulo 3, Brené Brown fala sobre um sentimento que certamente todos nós já experienciamos: a vergonha. Após contar um episódio pessoal, ela diz como que a empatia (ao invés do julgamento), do marido e de uma grande amiga, foi essencial para que ela conseguisse superar esse sentimento. Nas palavras dela: “Empatia significa conexão; é uma escada para fora do buraco da vergonha. (…) Não há maneira certa ou errada de demonstrar empatia. É simplesmente escutar, criar espaço para a sinceridade, não emitir julgamentos, se conectar emocionalmente e transmitir aquela incrível mensagem restauradora que diz ‘Você não está sozinho’.”
No capítulo 6, a autora trata da liderança. Ela inicia esclarecendo o que ela entende por líder: “é alguém que assume a responsabilidade de descobrir o potencial de pessoas e situações. O termo em nada tem a ver com a posição, status ou quantidade de subordinados.”
Pelo que Brené aprendeu em suas pesquisas e observou nos anos em que ela trabalhou com líderes de escolas e empresas de todos os tipos e tamanhos, um ponto chave que deve ser reexaminado é a motivação. Nenhuma instituição pode ter sucesso sem criatividade, inovação e aprendizado permanente, mas a maior ameaça a esses três elementos é justamente a falta de motivação.
Para recuperar a motivação é preciso que os líderes se comprometam a reumanizar a educação e o trabalho, ou seja, aprender a abraçar a vulnerabilidade, reconhecendo e enfrentando a vergonha:
“Vergonha produz medo. Ela diminui a nossa tolerância à vulnerabilidade e com isso atrofia a motivação, a inovação, a criatividade, a produtividade e a confiança. (…) Ela atua como os cupins em uma casa de madeira. Fica escondido no escuro, atrás das paredes, devorando gradativamente a nossa infraestrutura, até que um dia os degraus da escada desabam de repente. Então, descobrimos que é só uma questão de tempo até que as paredes também desmoronem.”
E quais são os sinais de que a vergonha impregnou a cultura de uma instituição?
Na visão de Brené Brown, culpa, fofoca, favoritismo, apelidos pejorativos e assédio são comportamentos indicadores de que a vergonha impregnou a cultura do lugar. Um sinal ainda mais claro é quando a vergonha se torna uma ferramenta explícita de gerenciamento. Nas palavras da autora: “A vergonha só triunfa nos sistemas em que as pessoas desistem de se comprometer com algo para se protegerem. Quando estamos desmotivados, nós não nos mostramos, não contribuímos e deixamos de nos importar. Além disso, a falta de motivação muitas vezes leva as pessoas a tentarem justificar todo o tipo de comportamento antiético, incluindo a mentira, o furto e a desonestidade.”
Então quais são as melhores estratégias para desenvolver empresas e organizações resilientes à vergonha?
Brené Brown lista quatro estratégias:
1. Apoiar líderes que desejem ousar, facilitar conversas honestas sobre o tema da vergonha e incentivar uma cultura de combate a ela;
2. Estimular um esforço consciente para detectar em que pontos a vergonha possa estar atuando na empresa e de que forma ela se dissemina na maneira como os relacionamentos com os nossos colegas de trabalho e alunos;
3. Estabelecer padrões como forma de combater a vergonha. Líderes e gerentes podem criar motivação ajudando as pessoas a saberem o que querem. Quais são as dificuldades em comum? Como as pessoas lidam com elas? Quais têm sido suas experiências?
4. Levar todos os funcionários a conhecer a diferença entre vergonha e culpa. E ensiná-los a dar e receber feedbacks sinceros, construtivos e compromissados, de maneira que isso encoraje o crescimento e a motivação.
No que se refere a feedbacks, em especial, a autora ressalta que a sua pesquisa deixou claro que a vulnerabilidade está no âmago do processo de feedback, seja para quem dá, recebe ou solicita feedback. E esta vulnerabilidade nunca desaparece, mesmo quando estamos acostumados e capacitados para oferecer e receber os feedbacks.
No entanto, a experiência positiva de aprendermos a ir “desarmados” para esse momento de feedback, nos dá a vantagem de saber que podemos sobreviver à exposição e à incerteza, e que o risco vale a pena. Aqui Brené traz uma dica valiosa de “ocuparmos o mesmo lado da mesa” durante todo esse processo de feedback, para que, assim, o “problema” não fique “entre nós”, mas “na nossa frente”, para que juntos possamos então enfrentá-lo.
O último capítulo do livro é dedicado aos pais, com valiosas dicas para criarmos filhos “plenos”. A pergunta que ela coloca é: Você é o adulto que deseja que seus filhos se tornem um dia?. Se você tem filhos, delicie-se. Vale mesmo a pena a leitura!
Bom, em um mundo complexo e competitivo que enfrentamos hoje, termino com um trecho da Brené para a nossa reflexão:
“Viver com ousadia não tem nada a ver com ganhar ou perder. Tem a ver com coragem. Em um mundo onde a escassez e a vergonha dominam e sentir medo tornou-se um hábito, a vulnerabilidade é subversiva. Incômoda. Até um pouco perigosa, às vezes. E, sem dúvida, desnudar-se emocionalmente significa correr um risco muito maior de ser magoado. Mas, quando faço uma retrospectiva da minha própria vida e do que viver com ousadia provocou em mim, posso dizer com sinceridade que nada é mais incômodo, perigoso e doloroso do que constatar que estou do lado de fora da minha vida, olhando para ela e imaginando como seria se eu tivesse a coragem de me mostrar e deixar que me vissem.”
Definitivamente, um livro para ler e reler….
E você, já leu? O que achou?
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